terça-feira, 19 de abril de 2011

falar com o passado do futuro



(ou nacionalismo versus multiculturalismo). (com divagações iniciais).

há uma ideia generalizada de que arquitectos e engenheiros, por natureza, se dão dificilmente. comigo não é assim, tenho poucos amigos arquitectos e muitos engenheiros, e costumo retirar mais gosto, mesmo em trabalho, de conversas e discussões com engenheiros do que com arquitectos.

ontem, para cumprir favor profissional, tive de ir jantar com um engenheiro de que não gosto nada, homem negativo, malcriado, pessimista (antigamente é que era), com alardes de superioridade e tiques de solidão. mas tecnicamente, em matéria de drenagens, um bês (mais que um ás). e o balanço final ficou em mais, mercê discussão técnica, sentido de dever cumprido e qualidade do bacalhau afogado em azeite frito com alho, sobre a imbecilidade do fulano e desperdício nele de verba social que mui melhor seria aplicada com muita gente de quem me lembro facilmente.

adiante. a conversa, a certa altura, passou pelo evolução galopante do mundo, e diz o engº: "isto mudou tanto e tão depressa que já não tem mais por onde mudar". e digo eu: "você nem faz ideia do que isto vai mudar ainda.....".

e agora, o post:

a estrutura pessoal de cada um passa pelos parâmetros em que se revêm. por exemplo, peça-se a alguém para se auto-descrever (ou descrever outrem) e percebe-se quais os parâmetros que essa pessoa valoriza (e até em que sentido os valoriza).

há 50 anos atrás, uma das coisas que quase todos os portugueses diriam era: "sou português, etc....". hoje muitos continuam a considerar a nacionalidade relevante na sua definição pessoal, mas são menos, e cada vez menos. hoje continuam a influenciar-se mentes jovens com estruturas antigas (religiões, clubes desportivos, associações várias, por exemplo os escuteiros, ramos militares). mas cada vez mais existem novas estruturas, novas provocações, mais variadas e menos controláveis a influencia-las (às mentes), num nunca acabar de sub-culturas e nichos e originalidades e "aberrações" e bizarrias (as minhas favoritas).

hoje não se estranha (ou estranha-se, mas não deixa de ocorrer) que um puto português tenha tremendas afinidades com um puto chileno, e até se identifique mais com ele do que com outro miúdo português. é frequente que vizinhos (até irmãos) tenham gostos e preferências diferentes e distantes, e encontrem afinidades em alguém distante fisicamente (continent wide) mas semelhante em preferências. e o miúdo pode dizer, correctamente, que é como o chileno e não como o irmão português.

isto acontece fruto da circulação de informação (primeiro via televisão, no que parecia um salto abissal e se revelou um pulito face ao poder da internet) e circulação de pessoas, gerando divulgação e descoberta de interesses, práticas, actividades. e fruto do interesse brutal das crianças em assuntos que os cativem, e que cada vez mais estão disponíveis. aos adultos acontece o mesmo, em menor escala, fruto de defesas e restrições que nos auto-impomos, uns mais do que outros. mas, mesmo em menor escala, acontece também cada vez mais.

a mim parece cada vez mais difícil descrever uma pessoa através de um parâmetro global de definição, porque cada vez há mais parâmetros válidos e cada diferente pessoa se vai definindo através de diferente parâmetro. cada vez menos será possível ou razoável comparar pessoas, porque cada vez mais se estará perante casos de alhos e bugalhos, pessoas que existem num universo já não uni ou bidimensional, mas tridimensional (and counting, i guess).

em contrapartida, cada vez será mais estimulante conhecer pessoas, porque cada vez mais estas serão únicas, ricas, in-copiáveis (mesmo nas cópias que fazem), e o acto de as conhecer, de lhes tocar, é cada vez mais enriquecedor.

suponho que já não somos uma mole de pessoas, todas num percurso unidireccional (eventualmente com dois sentidos) comum (a velocidades várias), comparáveis ao percurso lisboa/porto da antiga nacional 1, que se fazia em 5 ou 6 horas, e somos cada vez mais perceptíveis como uma imagem aérea de acesso a uma grande metrópole, cheia de entradas e saídas, viadutos sobrepostos, e mesmo esta imagem peca por defeito, porque há a acrescentar quem faz o percurso de comboio, ou metro, ou autocarro, felizardos que vivem dentro das cidades, outros em barcos, ecólogos que só andam de bicicleta, outros que não vão para a cidade porque estão desempregados, ou trabalham noutro local, ou em férias......

o mundo muda, a bola pula e avança. let's have fun.

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