quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

os/as amigos/as



é uma tradição (sexista) nas ilhas dos açores, o dia dos amigos (e o dia das amigas) (e o dos compadres e o das comadres). nestes dias, os amigos cumprimentam-se, falam-se, saem para jantar e noitada. o dia das amigas
tem ainda mais piada, porque as mulheres e raparigas saem juntas e excedem-se (percebe-se melhor tendo em conta que é uma sociedade pouco liberal, a açoreana).

tendo também em conta que se trata de comunidades que vivem isoladas (volto a isto no final), existe uma mais valia na amizade. no continente, em situações urbanas, de metrópole (....), é fácil desprezar os outros, ignora-los, passar ao lado de emoções humanas, porque existem mil e uma outras emoções a ocupar a atenção: o trânsito e outras disputas urbanas (filas de supermercado, atenção do empregado de mesa do café), o stress do trabalho, as tecnologias novas e atraentes, o sossego sem que ninguém chateie ao fim do dia. nos açores (tal como em zonas muito rurais do continente) também há isto, numa escala menor, sem a mesma importância.

estar numa ilha sozinho é muito teso, e é por isso que o conceito de dia dos amigos é importante. por isso, bom dia de amigos aos amigos (e amigas, para contornar o sexismo da coisa) que tenho espalhados por aí.

pos scriptum- acerca de estar isolado numa ilha, li na altura que o túnel da mancha foi aberto, num qualquer jornal inglês, um cabeçalho fenomenal: "o continente deixou de estar isolado", o que é uma excelente questão de perspectiva.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

regras



piada de introdução: uma vez um colega perguntou-me, de brincadeira, quem teria sido o primeiro homem mestruado. "foi
joão das regras" (jurista português do século XIV, que contribuiu para o início da segunda dinastia)... a piada é sequíssima, mas vem-me sempre que passo na rua, e voltou hoje, por causa do título do post.

acerca de regras e de tendências anárquicas:

regras são necessárias, mesmo fundamentais (pelo menos em fase de crescimento das entidades e/ou instituições). mas não necessariamente para (ou por) serem cumpridas. é a subversão das regras que permite crescimento (daí a necessidade delas).

normalmente, uma regra bem elaborada define princípios e prevê excepções. tomando por exemplo a história dos abusos da asae, quando se levam as regras à risca, dá asaeneira. uniformizar, a bem de simplificar, costuma trazer prejuízos à multiplicidade e criatividade.

no exercício do meu ofício tenho de cumprir regras, muitas delas imbecis. algumas subverter, quando estorvam, outras, por causa de licenciadores rigorosos, não. para deixar exemplos básicos: janelas no tecto não conferem iluminação e ventilação regulamentar; as casas de banho têm de ter determinado equipamento, mesmo que nunca seja utilizado pelos utilizadores; determinados espaços têm de ter determinado tipo de revestimento, o que inviabiliza milhões de outros, etc.

outro exemplo, o que me trás aqui: espaços de público, espectáculos, restauração e bebidas, têm de cumprir pipas de regras de circulação, funcionamento, equipamento, materiais, o diabo. isto levou a uma uniformização que diminuiu a qualidade dos espaços (ultimamente tem havido investimentos no aumento dessa qualidade, dentro do cumprimento de regras, por necessidades de sobrevivência económica).

no fim de semana estive no chapitô. quem conhece sabe que aquilo cumpre quase nenhuma regra e é um acumular de incumprimentos e excepções, e é por esse motivo (por criar um mundo fora de regras que funciona melhor que o regrado) que os espaços e vivências são fascinantes.

claro que as condicionantes ajudam, regrar um espaço existente, num centro histórico (edifícios com características pré-regras-actuais, dificilmente readaptáveis a elas) é impossível e fácil de justificar, e deixar que os edifícios se degradem é uma não opção. em consequência, torna estes edifícios mais apetecíveis para quem quer viver fora de regras. (noutra perspectiva, o valor destes espaços deveria levar a questionar as regras que os impossibilitam, não?).

não é que não se possa ser único cumprindo todas as regras, porque há maneiras e maneiras de as cumprir. nem é obrigatório que se seja único, admitindo-se que há vantagens em ser igual e em estar integrado, sendo que há maneiras e maneiras de estar integrado. mas há um prazer único em estar num espaço fora-de-lei, sem paredes convencionais em volta, fazendo o que se quer e como se quer, com as consequências que vierem, e em receber pessoas nesse espaço e modo de regras diferentes. just sayin'...