segunda-feira, 28 de novembro de 2011

des-escrição do sr pinguim












do lado sul do apartamento há uns cafés muito antigos: o ld (de "lancha de desembarque", porque o sr ribeiro se bateu nas áfricas), o abadia (onde nem sei o nome do fulano, antipático que é) e o pinguim, bodega portuguesa, explorada pelo sr manuel e a sua senhora.

o pinguim é minúsculo, duas mesas lá dentro encavalitadas no balcão e duas cá fora, a ocupar meia largura de passeio. a clientela é de duas vertentes: as senhoras educadas (alguns senhores, também, mas poucos), que entram para um café rápido, ao balcão; e uma xusma de bebedolas, que começa o dia com taças e jeropiga e vai alimentando a álcool o entusiasmo da jornada, com (re)visitas regulares.

o sr manuel (a joana gosta de lhe chamar sr pinguim, e à mulher sra pinguim, mas parece que ele não gosta e ela ainda menos, ela a sra pinguim, de quem não sei o nome) é polícia reformado, ainda mantém contactos, e é a pessoa certa para desenrascar uns conhecimentos em alturas de necessidade. ser reformado da polícia, mais os conhecimentos que isso acarreta, permite-lhe gerir muito bem a clientela da bebida e do barulho, equilibrando-se muito bem com o trato gentil às senhoras (e a mim, sr arquitecto), porque o homem é gentil por natureza, e ele não se desperdiçou na força.

certo é que o pinguim tem mais clientela que ambos ld e abadia, que lhe são, juntos, maiores de dez vezes.

também certo é que a sra do sr manuel faz um rolo de carne (que não é rolo, mas é cilíndrico e feito de carne, recheado com sei lá que lambarice e coberto de um molho a pedir que o lambam) que faz sucesso entre os clientes a precisar de uma sandes para o almoço (um dia, para me convencer, disse-me que a minha senhora gostava muito, e é verdade), e nós vamos sentir falta daquela bodega.

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

des-escrição do meu engenheiro







de introdução: já escrevi aqui que a má relação entre arquitectos e engenheiros é exagerada e que me dou muito melhor com engenheiros do que me dou com colegas, quase sempre. a acabar a introdução, o meu engenheiro não é propriamente o meu engenheiro, é um dos meus, e nem é só meu, é de outros. mas é meu há mais e melhor tempo.

o meu engenheiro deve ser a única pessoa a quem eu reconheço como mais e melhor idiota do que eu (em ambas, quantidade e qualidade). é um unha de vaca quase sem limites, de arrancar os cabelos ao ver, mas quando chega aos limites, é de uma generosidade deliciosa, como se lhe rebentasse o dique da avareza. é teimoso como uma mula e enerva-se descontrolado, mas ai de quem falar mal da mulher, dos filhos ou dos amigos. abusa no ferro do betão, mas vai à obra, e suja-se com o pessoal, e fala de igual para eles.

mas a característica dele que eu prefiro é indignar-se genuinamente com mesquindades alheias. e não se indigna de "filho da puta!", indigna-se de "está mal, não está?", sentido.

so, here's looking at you, my friend, long due.