segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

sorriso mortal



são cinco e meia da manhã e a rtp acabou de emitir a "morte em veneza" do visconti. está visto que serviço público começa às três da madrugada...

é um filme excelente, a qualquer hora. poucos diálogos, excesso em cenários e adereços (fantásticos). muita expressividade gestual, olhares que tanto são obscenos como invejáveis. é a história de um homem de meia idade que se perde de paixão pela beleza do jovem tadzio, rapaz polaco, numa veneza invadida pela peste (cuja presença quase cheiramos). como todos os pecadores, morre, mas porque há misericórdia no mundo, morre a olhar para tadzio, a entrar na imensidão do mar.

por mais excelente que esteja o filme, e está, é-o menos que o livro do thomas mann. comprei o livro por acaso, numa feira manhosa, em sintra. nunca tinha ouvido falar dele.

mann não tem as imagens do visconti, mas consegue pela escrita expressar muito mais profundamente toda a torrente de descontrolo do artísta (no livro, aschenbach é escritor, no filme músico). e onde as imagens são confrangedoras e até algo ridículas, a escrita preserva a genuinidade da paixão.

é uma paixão homossexual, pedófila. isso nunca é disfarçado (aliás, se o filme está preso à história do livro, o livro escolhe a homossexualidade e a pedofilia como pano de fundo), mas não é relevante na história que se conta. é uma história de paixão pela beleza (o rapaz que faz de tadzio, belo como um raio de sol, é tal como eu o tinha imaginado, ao ler o livro), e de como alguém se perde por ela, mantendo, todavia, controlo comportamental, por mais que a alma esteja em ebulição.

há apenas uma ocasião em que tal não acontece, quando o rapaz lhe sorri, e ele tem de se escapar para um banco de jardim escondido; "não deves sorrir assim, ouviste? não deves sorrir assim a ninguém!" (cito de memória, tenho o livro emprestadado, mais uma vez).

para mim, a história ilustra muitas coisas, a mais importante delas é que se deve amar (neste caso trata-se de paixão) sem pré-conceitos, usufruindo, tanto quanto formos capazes, da intensidade emocional que nos for proporcionada. porque todos morremos, algum dia, mas nem todos chegamos a viver.

2 comentários:

  1. "A morte em Veneza" é um dos filmes que considero GRANDES. Um verdadeiro hino ao AMOR, AMOR PLATONICO. Um aproximar de Mann ao amor e à beleza absoluta e nunca relativa. Quando Mann relata o andar daquela criatura, a graciosidade do andar (acaricia levemente a beleza e a divindade que lhe confere o estatuto de criatura, enquanto algo raríssimo) ele relata a sublimação e a delicadeza da beleza.

    Gostei de relembrar Visconti e o seu Mann

    Continuação de boas posatgens

    cs

    ResponderEliminar
  2. Pois, serviço publico as 3h da madrugada.por isso o Pais não produz...
    Os filmes por melhor que sejam, nunca são como os Livros, a nossa imaginação nunca é igual a do realizador. Fil

    ResponderEliminar